Em setembro de 2013, aconteceu o lançamento do catálogo da Semana do Graffiti de Fortaleza. Trata-se de um registro em imagens e textos do ocorrido em abril do mesmo ano, que contou com participantes locais e dois convidados interestaduais; Arem e eu. No mesmo, foi publicado uma entrevista comigo que segue na íntegra abaixo:
Vocês produzem em Recife e SP. Com este olhar 'estrangeiro', o que deu pra notar da cena? como está o graffiti em Fortaleza (qualidade, técnica, organização)?
Vocês produzem em Recife e SP. Com este olhar 'estrangeiro', o que deu pra notar da cena? como está o graffiti em Fortaleza (qualidade, técnica, organização)?
Difícil
dizer sobre a cena do graffiti em uma cidade permanecendo apenas 8 dias na
mesma, principalmente tratando-se de um evento com programação intensa. Digo
isso porque acredito que a cena se mede por trabalhos na rua, não por eventos.
Nas ruas o que pude ver e destaco é a pixação (com “x” mesmo, como escrevemos
na rua) muito presente nos diversos espaços da cidade e com característica particular.
Tratando
desta pratica dentro da semana de graffiti de fortaleza, percebo que há uma boa
diversidade; alguns desenvolvendo o graffiti tradicional com seus distintos
estilos de escrita e outros que desenvolvem um trabalho autoral inovando em
formas e técnicas.
Fale um pouco do início da jornada no
graffiti (ano que começou, motivação inicial, por que o graffiti).
Por
volta de 1997-98 eu viajava com torcida organizada para ver jogos de futebol em
diversos estádios brasileiros. Nestes, eu via muita pixação e despertei o
interesse em marcar os lugares por onde eu passava. Mas logo em seguida
observei os Throw Up (estilo de escrita) nas ruas de SP e me agradei mais desta
forma, sendo o que em seguida comecei a fazer. Em 2000, comecei a frequentar
oficinas culturais na Casa do Hip Hop Diadema, local onde ao mesmo tempo em que
eu aprendia técnicas e a cultura do graffiti, participava de grupos de estudos
e produção cultural.
Inicialmente
acreditei no graffiti como forma de protesto, em seguida o fazia como vaidade, “carimbo
de ego” em busca de reconhecimento. Hoje acredito na arte, em especial arte de
rua, como mecanismo de compreensão, reflexão e indagação sobre o que somos e
onde vivemos.
Para vocês, o que eventos como a I
Semana do Graffiti significam para as cenas locais?
Existem
diversos pontos de vista, dos mais simples aos mais críticos. Pode ser o momento
de juntar pessoas, confraternizar, fazer novas amizades. Ou incentivo pra quem
ta começando por ser um bom momento pra conhecer técnicas e saber quem são os
responsáveis pelas imagens que estão na rua. Também serve para alterar o visual
de uma grande área em pouco tempo sem pagar os devidos cachês por isso.
Hoje,
penso que o movimento graffiti necessita de eventos focados em troca de ideias
e financiamento para grandes projetos serem realizados. Ou seja, criar momentos
e grupos para estudar não só o conteúdo do que produzimos, o espaço público, as
relações sociais, mas também proporcionar aos artistas com trabalhos bem
desenvolvidos estrutura material e financeira para seus projetos.
Para vocês, o que diferencia o graffiti
das artes que estão nos museus?
Graffiti
só se caracteriza como tal estando na rua. Ele é produzido de forma totalmente
livre por quem o faz, por mais abstrata que tal liberdade seja. Não se submete
a leis, nem a aprovação de instituições. Ele é reflexo da vontade, capacidade e
disposição de seu autor em correr os riscos ou não pra realizar sua obra a sua
maneira.
Há
algum tempo o graffiti passa por um processo de domesticação, induzido a ser
uma prática que só se caracteriza pela autorização de sua feitura, pelo
enquadramento em certas regras, o que já se aproxima de instituições de arte.
Mas a pixação, que considero uma forma de graffiti, é um exemplo que nem todos
leões viram gatinhos adestrados.
O
graffiti estando em via pública é acessível pra qualquer pessoa que transite
por tal local. As artes dentro de um museu estão em uma instituição que parece
ter uma catraca invisível dificultando a entrada da maioria da população,
embora muitos não cobrem ingresso. Para discutir os “porques” disso entraríamos
em outros assuntos como educação e aphartaid social.
Então,
no Brasil, o graffiti pode até não ser a obra negada pelas instituições de
arte, mas é a obra cujo ao autor, em sua maioria, foi negada condição digna de
vida pra se desenvolver como ser humano produtor de conhecimento e de quem não
se espera uma “grande arte”.
Existe o profissional do graffiti? quem
ganha dinheiro com isso? ou isso não é o foco principal do artista? (arte x
mercado)
Se
graffiti ainda é crime, os profissionais dele seriam criminosos.
Tanto
eu, como a maioria das pessoas que conheço não iniciou-se no graffiti pensando
em ganhar dinheiro com isso. Creio que o graffiti é o atrativo inicial pras
artes em locais que a educação pública não cumpre este papel. Daí ele impulsiona
a chegarmos a outros conhecimentos que podem nos levar a uma profissão como
arte educador, ilustrador, designer, artista com trabalho para galerias etc. Por
outro lado, graffiti pode ser apenas uma diversão, o “futebol de fim de semana”
onde um profissional de outra área descontraí só ou com amigos.
Entrando nessa seara, o grafiteiro é um
artista?
Pra
definir artista seria necessário definir arte e para definir grafiteiro seria
necessário definir graffiti, o que torna complicado falar sobre isso. Dentro do
movimento do graffiti, pra quem é adepto de certos estilos, existe até um preconceito
com a palavra “artista”, tendo ela como forma pejorativa. Por outro lado esta
definição pode soar como reconhecimento do trabalho para outros.
Existe um 'estilo próprio' do graffiti
de Fortaleza? Há algum destaque local que vocês queriam comentar (que tenha
chamado a atenção de vocês pela técnica, qualidade, etc)?
A
pixação de Fortaleza tem suas particularidades, mas circulei pouco pra comentar
mais sobre o assunto.Publicado em 13/08/2014
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